Jogo de

Pintar

uma prática de pintura intuitiva

O que é?

O jogo de Pintar é uma prática de pintura intuitiva, ou seja, é tão orgânica a sua forma de fazer que qualquer pessoa assimila muito rapidamente as poucas regras e maneiras de jogar. O fazer por si só traz a tona a habilidade e a prática constante desenvolve a potencialidade e o fazer criador. 

Não há prérequisitos para iniciar um jogo de pintar. Tudo o que precisa é a disponibilidade de brincar com as tintas e pinceis, todo o resto se organiza de forma muito natural. A pessoa se vê diante do papel branco e por mais que isso possa parecer assustador para muitos, no início, traz um fascínio sem igual. 

Todas essas características fazem do jogo de pintar uma prática sem precedentes, necessária para reestabelecer o caminho perdido da expressividade autoral. 

Não é aula de pintura, não tem modelos, não há competições nem comparações. 

Cada pessoa pinta em seu papel e compartilha pincéis e tintas com o grupo. 

É como entrar num playground, não há necessidade de explicar os brinquedos que estão lá, e mesmo que se explique, nada supera a experiência do brinquedo. Assim acontece com o jogo de pintar.  

As práticas acontecem somente no ateliê denominado Closlieu ou Cloliê, em português, sempre em grupo de no mínimo 4 e no máximo 12 pessoas de idades entre 3 e 100 anos, sem limite, sem distinção, sem categorização. Todos são bem vindos e todos são capazes. 

Closlieu

Closlieu é um neologismo em francês que significa literalmente, “lugar fechado”, abrigado, protegido. Esse é o conceito do espaço criado por Stern e que se diferencia dos ateliês comuns. Esse espaço tem apenas o que é necessário para a prática do Jogo de Pintar. Não é um espaço híbrido capaz de acomodar várias técnicas, ele é usado somente para esse fim. 

No Brasil, quando iniciei minha prática como Servant de Jogo de Pintar, traduzi e adaptei alguns termos usados por Stern, a fim de elucidar os que queriam conhecer essa prática. Portanto, tomei a liberdade de criar um neologismo em português, que se chama Cloliê. 

O Cloliê é o local apropriado para o Jogo de Pintar e, portanto, tem características muito especiais e imprescindíveis para o bom funcionamento da técnica. Mesmo fazendo adaptações, por vezes necessárias, é fundamental conservar suas bases para garantir que o Jogo aconteça e, principalmente, que a Formulação possa estabelecer-se.

O Cloliê consiste em uma sala onde as paredes são forradas com isolantes e por cima papel craft, sem janelas ou aberturas que tenham interferências externas, e que contém os materiais próprios para o Jogo de Pintar. 

A estrela da sala é a Mesa-paleta, um instrumento bastante interessante e determinante para o andamento do Jogo. Essa mesa contém dezoito godês com tinta guache, de cores diferentes, dezoito copos com água correspondentes às cores, porta-pincéis, cada cor tem seu jogo com três pincéis, sendo dois mais finos e um grosso, nas laterais dois suportes para as tachinhas e o borrifador de água e embaixo da mesa, um suporte para os potes de tinta para reposição.

Arno Stern

Judeu e alemão de nacionalidade, ainda muito novo teve que sair de seu país e fugiu com a família durante vários anos pelas cidades da França e da Suíça, por conta da perseguição nazista.  

Vivendo como refugiado, sem documentos ou diplomas, ele começou a trabalhar na Casa da Criança, um orfanato para meninos e meninas que perderam seus pais durante a guerra. Lá, sua tarefa era a de “entreter” as crianças com atividades artísticas.  

Daí nasceu a primeira “formação” de seu trabalho: tratar o individual e o coletivo de maneira distinta e organizada a ponto de um não excluir o outro. Portanto, aquilo que aconteceu casualmente, por conta de Stern ter iniciado seu trabalho num orfanato, onde não tinha agrupamentos por idade, nem gênero, é seu trabalho até hoje, o Jogo de Pintar, prática intuitiva de pintar/desenhar que se desenvolve no Closlieu.

Formulação

Ao longo de seu trabalho, Arno percebeu padrões de desenhos muito semelhantes entre todas as crianças com quem convivia tanto no orfanato quando em seu ateliê em Paris e com o apoio da UNESCO que conseguiu viajar por quase 10 anos por lugares como o deserto da Mauritânia, Peru, México, Nigéria, Afeganistão, Etiópia, Guatemala, Costa do Marfim e Nova Guiné em lugares, onde o ato de desenhar nunca tinha sido experimentado tal como conhecemos. 

Esse fato o fez catalogar padrões e agrupá-los de modo que pudessem ser compreendidos e estudados a fim de provar que o ser humano tem em seu interior um esquema composto por ícones que são códigos universais de expressão. Esses códigos não são para a comunicação direta e sim para a expressão de um reconhecimento, no sentido de que o homem, quando criança, percebe que é capaz de fazer determinadas formas e que essas podem ser identificadas também na natureza. A esse conjunto de códigos, Arno deu o nome de Formulação.

aspas-abertura-brancas

O desenho, segundo Stern, é fruto de uma série de traços que respeitam leis e princípios inerentes à espécie humana, ou seja, a Formulação é que dita as regras de desenvolvimento desse traçar.

aspas-fechamento-brancas

A Semiologia da Expressão é uma ciência também criada por Stern para estudar esse fenômeno, cujo desenvolvimento acontece em três fases distintas, porém “rizomáticas” e de certa forma “fractais”. Iniciam, por exemplo, com um embrião enrolado na “garatuja” e desenrolam-se até o surgimento da figura redonda. Na figura redonda está contida a garatuja, porém ela não pode ser mais vista, mas para quem conhece a Formulação e suas características, a figura redonda, conhecida como “bolinha”, é uma conquista feita por meio do exercício repetitivo advindo da garatuja. E dessa figura redonda virá mais uma série de outros traços conquistados por essa constante execução, provindas de uma necessidade incontrolável da criança de traçar e marcar.

A Formulação tem 3 fases que não estão relacionadas com idade, gênero ou cultura, e sim com a necessidade e a maturidade neurológica e física do indivíduo

Figuras Primárias

Não há intenção de representação. A criança está conhecendo seu potencial e executa várias e várias vezes os mesmos traços. Tudo inicia com o giruli. 

Objetos-Imagem

Realização do que se vê no mundo. É o reconhecimento das possibilidades do traço e os primeiros traçados.

Figuras Essenciais

É o movimento e traçado sem representação, apenas a necessidade de fazer o traço de acordo com o movimento. Desenhos oníricos aparecem e mesclam todos os traçados preenchendo o espaço com cores e formas.